Por Priscila Manhães
Hécate também é uma Titânia, ou seja, uma divindade pré-olímpica. Sua origem é muito discutida, mas parece ser uma variação da egípcia HEKET ou HEQ - a matriarca tribal no Egito pré-dinástico. Na Grécia, seu culto começou na Trácia (a parte nordeste do país), primitivamente associada à Lua.
Embora pouco citada nos livros de mitologia (que, normalmente, só tratam dos deuses olímpicos), hoje sabe-se que seu culto era muito amplo e generalizado nas classes populares, geralmente com o título de "Kratay" ou "Eurybia" - que significa DEUSA FORTE.
Na mitologia grega mais recente, Hécate aparece tão poderosa no céu como na terra, honrada e temida até pelo próprio Zeus.
Segundo uma lenda, Zeus estabeleceu um decreto que dizia que "cada vez que alguém deita uma oferenda na terra sem ofertá-la a nenhum deus específico, essa oferenda é de Hécate". Isso só demonstra que ele reconhecia que, em princípio, tudo que está sobre a Terra é território dessa deusa.
Outro fator interessante é que, diferentemente de outras deidades antigas, Hécate foi absorvida no panteão clássico grego com pouca alteração - provavelmente pela força de sua simbologia e culto no costume popular.
Seja como for, tudo isso indica tratar-se de uma deusa muito antiga e muito respeitada - muito provável, uma remanescente das primitivas "Deusas Tríplices", cultuadas antes do estabelecimento de qualquer panteão organizado. Provas disso são seu principal título - HÉCATE TRÍVIA - e sua forte ligação com a noite e com a Lua - o que a liga aos antigos cultos da Europa Central e da Ásia Menor. Provavelmente, Hécate é a corporificação grega da Deusa Tríplice original. Há quem defenda a tese de que Hécate é a face Anciã dessa Deusa antiga, havendo as faces Donzela e Mãe sido absorvidas completamente por outras deusas - tais como Ártemis e Deméter, respectivamente. Além disso, seu local de culto são as encruzilhadas de três caminhos; dizia-se que ela ficava nesses pontos, olhando para cada um deles com uma das faces.
Em seu aspecto luminoso, Hécate foi associada a Apolo (o Deus da Luz). Os mitos gregos mais antigos atribuem a ela a concessão de prosperidade material, o dom da eloquência nas assembleias políticas, a vitória nas batalhas e nos jogos; era ela, também, que promovia o aumento dos rebanhos e favorecia a boa pesca. Interessante notar que Hécate era considerada a PROTETORA DA JUVENTUDE - atributo associado a Ártemis e Apolo (os gêmeos). E vale lembrar que um dos epítetos de Apolo é "Hécatos", tornando-o uma versão masculina da Grande Deusa.
Seu aspecto sombrio liga-se ao fato de ser uma deusa lunar e, portanto, associada à noite. Daí sua representação artística a apresentar portando tochas e com um vestido feito das estrelas, cuja luz mostrava o caminho dentro da vasta escuridão das nossas origens e da profundeza de nosso ser interior. Por sua natureza ser originariamente misteriosa, os gregos helênicos enfatizaram seus poderes destrutivos à custa de seus poderes criativos, até que Hécate fosse apenas invocada como uma DEUSA DO SUBMUNDO. Torna-se, então, a SENHORA DOS MORTOS, líder da "Caçada Selvagem".
Nesse aspecto, é acompanhada por "fantasmas", corvos, corujas e, sobretudo, cachorros - que uivam lugubremente para a Lua -; suas lendas falam que ela passa pela terra, com seu séquito, ao pôr do sol para recolher os mortos daquele dia. Por isso, muitas vezes também é representada com um athame ou uma foice (em seu cinto ou na mão), usado para cortar as "ligações" com o mundo dos vivos.
Como Prytania, Invencível Rainha da Morte, Hécate tornou-se guardiã do submundo. Esse aspecto foi tradicionalmente associado à Lua Nova (particularmente na sua face de Lua Negra). Como DEUSA DA MAGIA E DOS FEITIÇOS, ela manda sonhos proféticos ou pesadelos à humanidade. Sua presença é sentida nos túmulos ou nas cenas de assassinato, onde preside as purificações e expiações. Como sua semelhante Kali, na Índia, Hécate é SACERDOTISA DOS FUNERAIS, conduzindo seus ritos nos locais de enterros e cremações, assistindo e auxiliando na liberação dos recém-mortos.
Arquetipicamente, Hécate é uma figura primordial nas camadas mais antigas do inconsciente humano. Sua simbologia nos remete ao princípio dos tempos, como filha de Nyx, a Noite Antiga. Hécate é A GUARDIÃ DOS MISTÉRIOS PROFUNDOS DO INCONSCIENTE que acessa a memória do inconsciente coletivo e das forças primitivas.
Do mesmo modo que lidera a Caça Selvagem, Hécate conduz os mortos e os vivos aos melhores caminhos (tocha na mão). Ela é a SENHORA QUE GUIA. Preside os nascimentos, por isso é chamada "Protiraya", a SENHORA DOS PORTAIS, sendo a vagina o portal do ingresso nesta vida. Assim, é invocada durante os partos como condutora ao renascimento, junto com ÁRTEMIS (que é parteira e protetora das crianças).
Considerada como a Deusa das Deusas e Rainha das Bruxas, Hécate preside todos os rituais mágicos, profecias, visão, o nascimento das crianças, morte, o submundo e os segredos da regeneração. A velha mulher curvada pelo peso dos anos, a curandeira, a bruxa; aquela que conhece todos os sintomas do corpo e da alma humana. Esse é seu arquétipo.
A natureza profética de Hécate sobreviveu na Noruega e na Suíça, como A VELHA, sabia mulher falante, que viajava pelas fazendas e dizia aos moradores dos campos seu futuro. Mas com o advento do domínio patriarcal a Deusa diminui sua influência e grandeza. Os poderes da sábia anciã foram reprimidos e mais tarde emergiram como projeções torturadas e distorcidas do patriarcado, classificadas como bruxaria perigosa e magia negra.
Hécate é toda potencial - o potencial daquilo que ainda não é, como uma semente que germina, subterrânea. Ela é mágica, caótica, imprevisível. Deve ser invocada quando todas as coisas sólidas e pretensamente seguras desabam, e é preciso pensar em novos sonhos e possibilidades.
Ela é SENHORA DO CALDEIRÃO DAS TRANSFORMAÇÕES, onde residem todas as possibilidades. Um trabalho com Hécate pode ter mil facetas justamente por isso: pode-se trabalhar desde os entraves na sua vida financeira, até seu caminho espiritual, suas capacidades mágicas e oraculares até pedir a intercessão dela em um caso de morte ou nascimento difíceis; pode pedir que ela oriente você ao melhor caminho nas encruzilhadas da vida..."
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