(autoria desconhecida)
Para a Wicca, existe um Princípio Criador que não tem nome (mas alguns o chamam de “Uno”) e que está além de todas as definições e compreensões possíveis. Desse princípio, surgiram as duas grandes polaridades, que deram origem ao Universo e a todas as formas de vida.
A Deusa
A Grande Mãe representa a energia universal geradora, o útero de toda a criação. Ela é associada aos mistérios da Lua, da intuição, da noite, da escuridão e da receptividade. Ela é o inconsciente, o lado escuro da mente que deve ser desvendado. A Lua nos mostra sempre uma face nova a cada sete dias, mas nunca morre, representando os mistérios da vida eterna. Na Wicca, a Deusa se mostra com três faces: a Virgem, a Mãe e a Velha Sábia sendo que esta última ficou mais relacionada à bruxa na imaginação popular. A Deusa tríplice mostra os mistérios mais profundos da energia feminina, o poder da menstruação na mulher, e é também a contraparte feminina presente em todos os homens, tão reprimida pela cultura patriarcal.
A Deusa foi à primeira divindade cultuada pelo homem pré-histórico. As suas inúmeras imagens encontradas em vários sítios históricos e arqueológicos no mundo inteiro representavam a fertilidade da mulher e da Terra. Por ser a mulher a doadora da vida atribuiu-se a ela a fonte criadora universal e a Mãe Terra tornou-se o primeiro contato da raça humana com o divino.
Mas afinal, quem é essa Deusa? Só o fato de termos que fazer essa pergunta demonstra o quanto nossa sociedade ocidental formada sob a égide da mitologia judaico-cristã se afastou de nossas origens. Fomos criados condicionados por uma cosmologia desprovida de símbolos do Sagrado feminino, a não ser Maria, Mãe Divina, que não tem os atributos divinos, que são reconhecidos apenas ao Pai e ao Filho e é substituído na trindade pelo conceito de Espírito Santo. Maria é, quando muito, a intermediária para a atuação dos poderes do Deus... "peça à Mãe que o Filho concede..." Mas Maria não é a Deusa, senão um de seus aspectos mais aceitos pela sociedade patriarcal, de coadjuvante do Deus, reproduzindo o fenômeno social do patriarcado em que a mulher auxilia o homem, mas sempre lhe é inferior e, por isso, deve submeter-se à sua autoridade.
Não somos feministas nem queremos partir para discursos feministas, mas tão somente constatar que a ausência de uma Deusa nas mitologias pós-cristãs se deve ao franco predomínio do patriarcado. Predomínio esse que nos trouxe, ao final do século XX, a uma sociedade norteada pelos valores da competição selvagem, da sobrevivência do mais forte, da violência ao invés da convivência, do predomínio da razão sobre a emoção. Mas a Deusa está ressurgindo desde a década de 60, reafirmando-se nos últimos anos.Estamos re-descobrindo a Terra e lhe dando o seu devido valor negado há anos.Tudo isso sob pena de que se não mudarmos nossa mentalidade, não mais haverá espécie humana.Isso fez decolar a consciência ecológica e o renascimento dos valores ligados à Deusa que estão novamente voltando à tona: paz, convivência na diversidade, cultura, as artes e o respeito a outras formas de vida no planeta.
Cultuar a Deusa hoje significa reconsagrar o sagrado feminino curando assim a Terra e a essência humana. Quer sejamos homens ou mulheres, sabemos que nossa psique contém aspectos masculinos e femininos. Aceitar e respeitar a Deusa como polaridade complementar do Deus é o primeiro passo para a cura de nossa fragmentação dualística interior. A Deusa é cultuada como Mãe Terra, representando a plenitude da Terra e sua sacralidade. Sobre a Terra existimos e ao fazê-lo, estamos pisando no corpo dela aqui e agora, muito diferente da crença em um deus onipotente e distante que vive nos céus. A Deusa é a Terra em que pisamos, nossos irmãos animais e plantas, a água que bebemos, o ar que respiramos, o fogo do centro dos vulcões, os rios, as cores do arco-íris, o meu corpo, o seu corpo.A Deusa está em todas as coisas.Ela é aquela que canta na natureza e o Deus Cornífero seu consorte, segue sua música e dança a vida.Cultuar a Deusa não significa substituir o Deus ou rejeitá-lo. Ambos, Deus e Deusa são lados da mesma moeda, as duas faces do Todo. A Deusa é a criadora primordial, o Deus o primeiro criado, e sua dança conjunta e eterna, em espiral, representa a eterna dança da vida.
A Deusa também é a Senhora da Lua e, mais uma vez, a explicação desse fato remonta às cavernas em que já vivemos. O homem pré-histórico desconhecia o papel do homem na reprodução, mas conhecia muito bem o papel da mulher. E ainda considerava a mulher envolta em uma aura mística, porque sangrava todo mês e não morria, ao passo que para qualquer dos homens sangrar significava morte. Portanto, a mulher devia ser muito poderosa, ainda mais que conhecia o "segredo" de ter bebês... É fácil entender porque a mulher era identificada com a Deusa, ou, melhor dizendo, porque a primeira divindade conhecida tinha que ter caracteres femininos... Ainda mais quando as pessoas descobriram que a gravidez durava 10 lunações e a colheita e o suceder das estações seguia um ciclo de 13 meses lunares. O primeiro calendário do homem pré-histórico foi mostrado nas mãos da famosa estatueta da Vênus de Laussel, que segura em sua mão um chifre em forma de crescente, com 13 talhos que representam as lunações. Por sua conexão com a Lua e a mulher, a Deusa é cultuada em 3 aspectos: a Donzela, que corresponde à Lua Crescente, a Mãe representada na Lua Cheia e a Anciã, simbolizada na Lua Decrescente, ou seja, Minguante e Nova.
Na tradição da Deusa a Donzela é representada pela cor branca e significa os inícios, tudo o que vai crescer, o apogeu da juventude, as sementes plantadas que começam a germinar, a primavera, os animais no cio e seu acasalamento. Ela é a Virgem, não só aquela que é fisicamente virgem, mas a mulher que se basta, independente e auto-suficiente. Como Mãe a Deusa está em sua plenitude. Sua cor é o vermelho e sua época o verão. Significa abundância, proteção, procriação, nutrição, os animais parindo e amamentando, as espigas maduras, a prosperidade, a idade adulta. Ela é a Senhora da Vida, a face mais acolhedora da Deusa.
Por fim, a Deusa é a Anciã, que é a mulher sábia, aquela que atingiu a menopausa e não mais verte seu sangue, tornando-se assim mais poderosa por isso. Simboliza a paciência, a sabedoria, a velhice, o anoitecer, a cor preta. A Anciã também é a Deusa em sua face negra de ceifadora, a Senhora da morte. Aquela que precisa agir para que o eterno ciclo dos renascimentos seja perpetuado. Esta é o aspecto com que mais dificilmente nos conectamos, porém, a Senhora da sombra, a Guardiã das trevas e Condutora das almas é essencial em nossos processos vitais. Que seria de nós se não existisse a morte? Não poderíamos renascer, recomeçar e consequentemente evoluir na espiral do renascimento.Desta forma, é fácil compreendermos porque a Religião da Deusa postula a reencarnação. Se fazemos parte de um universo em constante mutação, que sentido haveria em crermos que somos os únicos a não participar do processo interminável da vida-morte-renascimento? Essa realidade existe no microcosmo do ciclo das estações, da colheita que tem que ser feita para que se reúnam as sementes e haja novo plantio.
É justamente por isso que aqueles que seguem o Caminho da Deusa celebram a chamada Roda do Ano, constituída pelos oito Sabbats que marcam a passagem das estações. Ao celebrar os Sabbats, cremos que estamos ajudando no giro da Roda da Vida, participando assim de um processo de co-criação do mundo. Submeter-se à sua autoridade.
Por isso, depois de tudo o que dissemos, fica fácil para todos entenderem o porque de os caminhos, cultos e tradições centrados na Deusa são religiões naturais, fundamentadas nos ciclos da natureza e no entendimento de seus elementos e ritmos. Estas práticas de magia natural usam a conexão e correlação dos elementos da natureza (água, terra, fogo e ar), as correspondências astrológicas (signos zodiacais, influências planetárias, dias e horários propícios, pedras e minerais, plantas, essências, cores, sons etc...) e a sintonia com os seres elementais (Devas, Guardiões, Gnomos, Silfos, Ondinas, Salamandras, Duendes e Fadas) para atingir os seus objetivos mágicos mais facilmente.
O Deus
Da mesma forma que toda luz nasce da escuridão, o Deus, símbolo solar da energia masculina, nasce da Deusa, sendo seu complemento e trazendo em si os atributos da coragem, pensamento lógico, fertilidade, saúde e alegria. Da mesma forma que o sol nasce e posteriormente se põe, o Deus nos mostra os mistérios de morte e do renascimento diariamente. Na Wicca, Ele nasce da Grande Mãe, cresce, se torna adulto, apaixona-se pela Deusa virgem, eles fazem amor, Ela fica grávida e finalmente o Deus morre no inverno somente para nascer novamente como a criança da promessa.Assim, fechamos o ciclo do renascimento, que coincide com os ciclos da Natureza, e que mostra os ciclos da nossa própria vida. Para alguns, pode parecer incestuoso que o Deus seja filho e amante da Deusa, mas é preciso perceber o verdadeiro simbolismo do mito, pois do útero da Deusa todas as coisas vieram, e, para ele, tudo retornará. E, se pensarmos bem, as mulheres sempre foram mães de todos os homens, pelo seu poder de promover o renascimento espiritual do ser amado e de toda a Humanidade. O sentido profundo do simbolismo na Bruxaria só pode ser verdadeiramente entendido através da meditação e do contato intuitivo com a energia dos Deuses.
Invariavelmente, o Deus é deixado de lado muitas vezes nos cultos pagãos, como se a energia da Deusa pedisse essa dedicação exclusiva. Isto é verdade em parte, porque, não é possível cultuar o Deus adequadamente enquanto não mergulharmos na Deusa e nos despirmos do Deus do patriarcado, mas devemos sempre nos lembrar que os dois se completam e que está na hora de fazermos Ele voltar.A própria Deusa nos mostra-o como seu filho, consorte, defensor e ancião.
A primeira face do Deus é como a criança da promessa, a semente do sol no meio da escuridão. Depois, é o garoto do pólen, o fertilizador em sua face mais juvenil, que traz a energia da alegria de viver e tem o poder de se maravilhar ante as descobertas da vida.Ele é o experimentador, a face mais sorridente do sol matinal.
Daí surge o Deus azul do amor, o rapaz que cresceu e chegou na adolescência desabrochando em beleza e masculinidade.Ele é o Jovem Deus da primavera que percorre as florestas e acorda toda a natureza. Ele é o apaixonado, aquele que primeiro busca a Deusa como a Donzela e propicia o encontro... Ele é o Deus da sedução ainda inocente, que ainda não conhece os mistérios da Senhora.Nessa etapa o Deus é todo possibilidades.
Depois Ele é o Galhudo.O Deus é o macho na sua plenitude, O Senhor dos chifres que desbancou o gamo-rei anterior.Ele é pura força e poder, músculos e vitalidade, ele cheira a sexo e a promessas.É o Grande amante atraído irresistivelmente pela Senhora.Ele é o provedor, o sustentador, o Senhor defensor. Senhor das coisas selvagens e livres.Ele é o Deus da dança da vida, o falo Ereto, o fertilizador.
Como Green Man em uma outra face sua, ele também é o Senhor da Terra e de toda a sua abundância, o parceiro da Senhora dos Grãos. O Senhor dos brotos, aquele que cuida dos frutos e os distribui pela terra.
Mas o Deus é também o trapaceiro, o Senhor da embriaguez, o desafiador e o ancião da Justiça. Ele nos faz seguir um caminho e nos perder para podermos então conhecer o pânico de Pan.Ele nos deixa loucos como Dionísio, ou perdidos nos devaneios de Netuno.Ele é o desafiador, seja nos duelos, na guerra ou na luta pela sobrevivência.Ele é caprichoso e insidioso, ele nos engana, nos deixa desesperados e sorri porque esse é o seu papel.Estimular o novo mostrando que nosso desespero é inútil e só nos escraviza.
Assim como a Deusa, Ele está na fome e no fim da fome, na vida e na doença terminal, na luz e nas sombras, no que é bom e no que é mau.A Deusa nunca está só, ela tem sua contraparte masculina e, no entanto, Ele só existe por amor a Ela.Todos nós somos fruto dessa dança do amor Divino.O Deus é o ancião sábio, o distribuidor da Justiça.Ele conhece os segredos dos oráculos, mas sabe que são Dela.Ele é o repositório do conhecimento, mas a sabedoria é Dela... ele lê os sinais da natureza, mas sabe que quem os escreve é Ela.
E o velho sábio vai murchando e se transforma no Senhor da Morte.Ele que é o Senhor dos dois mundos, pois no ventre dela, de volta, ele vive sua morte e a própria ressurreição. Mistério e segredo, morte e retorno, Ele é o que atravessa os portais dos quais Ela é a Senhora. Ele, o Caçador, que também faz o papel de Ceifador... Ele que ronda o leito dos moribundos e dança a dança da morte. O Senhor dos esqueletos.
Ele que na dança da morte retoma o brilho do sol e sua face negra se ilumina, em uma explosão impossível de conter, e Lugh nasce outra vez...
Ele que é Pai, Filho, Bebê Iluminado, Amante Selvagem, Sábio Educador... ele, o Deus que se revela apenas pela Deusa.
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