O nascimento de Vênus idealizado por Sandro Botticelli
Tela de Tintoretto, representando o nascimento da Via Láctea, a partir do jorro de leite materno
Diana, deusa da Caça, imortalizada como a provedora
Vênus e Cupido: uma alegoria de Agnolo Bronzino (1503-1572) sobre os prazeres e delícias do amor
Vênus banhando-se, a deusa da beleza e do amor numa cópia romana a partir do século III a.C., se encontra no Museu Pio-Clementino
Evidências arqueológicas como estátuas, amuletos, vasos e outros inúmeros objetos encontrados por pesquisadores ou mesmo pessoas comuns, expressam o sagrado e o divino, afirmando que a primeira religião da humanidade foi o culto à Deusa.
Esta deidade unia-se essencialmente à figura materna. Naqueles tempos, vale à pena frisar, a participação masculina para a procriação era completamente desconhecida, consequentemente desprezada.
Isto implica que, desde nossos primórdios, tínhamos a maternidade e o nascimento como eventos sagrados, abençoados. A maternidade era considerada uma função divina a partir de uma entidade superior feminina. Ou seja, era uma Deusa-Mãe que decidia quem seria mãe.
As maiores evidências do culto à Deusa vêm de inúmeras esculturas de mulheres grávidas com grandes seios, coxas, nádegas e vulvas. Essas imagens foram chamadas pelos arqueólogos de Vênus e representavam objetos de culto à Grande Deusa Mãe. Elas eram feitas, geralmente, de pedras, ossos ou barro. Foram encontradas espalhadas por países europeus com sítios paleolíticos como Espanha, França, Alemanha, Rússia, Inglaterra e Áustria. A arte das vênus revela o que aquelas culturas valorizavam e os conhecimentos que elas desejavam que fossem transmitidos.
Sem o conhecimento do ato sexual com associação à gravidez, todos acreditavam que as mulheres tinham gerado seus bebês a partir delas mesmas, sem a ajuda do homem ou do ato sexual, e por isso eram consideradas as doadoras da vida.
As crianças nascidas pertenciam à comunidade e mães e crianças ilegítimas não existiam. As crianças recebiam os nomes de suas mães e de suas linhagens, sendo assim culturas matrilineares e matrifocais. A mulher era a portadora de todo o poder e tinha status social mais alto que os homens. Naquela época, as mulheres não eram consideradas dependentes ou propriedade dos homens.
Quanto ao culto, as mulheres eram as grandes sacerdotisas da Deusa. Elas eram as adivinhas, parteiras, curandeiras, transmissoras da cultura da Deusa e guardiãs dos mistérios.
Como passavam a maior parte do tempo nas tribos, enquanto os homens saíam para caçar, elas desenvolveram a língua, a agricultura, a culinária etc. Como religiosas no culto à Deusa, catalogaram o uso mágico e medicinal das ervas. Foram responsáveis pela criação dos primeiros calendários que eram lunares, e não solares, pois, por essas medições controlavam seus ciclos menstruais, o plantio e a colheita dos vegetais.
Os primeiros antropólogos e arqueólogos já afirmavam que a primeira divindade cultivada era feminina. A teoria coincide com antigos mitos e crenças de que a criação teria ocorrido por meio de uma autofertilização. Dessa crença originam-se as religiões agri-culturais.
As estátuas citadas anteriormente datam da Era Cro-Magnom, do Paleolítico superior, entre os períodos de 35.000 e 10.000 a.C.. No Sul da França foi encontrada a Vênus de Laussel. O achado estava em um provavelmente santuário de caça que data de 19.000 a.C.. Ela é vermelha, talvez sugerindo sangue, um símbolo da vida, e em uma das mãos, carrega um chifre.
Outras figuras semelhantes, anteriores ao período Protoneolítico, de 9.000 a 7.000 a.C., e decoradas como se fossem objetos de culto, foram descobertas em várias localidades.
Na Suméria, por volta de 4.000 a.C., as nobres femininas eram associadas à Deusa. Ela era vista como Criadora, Donzela, Mãe, Destruidora, Guerreira, Caçadora, Artista, Jurista, Curandeira e Feiticeira. Suas funções e habilidades aumentaram com o desenvolvimento das culturas que a veneravam. Através dos séculos, adquiriu centenas de nomes e faces, mas sempre representando a natureza. Foi associada ao Sol, à Lua, à Terra, aos céus. Por isso a religião da Deusa é considerada a religião da natureza, em todas as suas formas.
A Deusa encenava o princípio divino criador do universo. Com a ascensão do culto aos deuses masculinos e o surgimento do patriarcado, por volta da Era de Áries, aproximadamente 2.000 a.C., Ela foi silenciada. Mas, atualmente seu culto ressurge com força em inúmeros lugares do planeta, por meio de movimentos religiosos feministas que buscam uma maior ligação com a Terra, sobretudo entre os Wiccanianos.
Para eles, a Deusa é tríplice e, ao mesmo tempo, uma única divindade. Seus aspectos são a Donzela, a Mãe e a Anciã. Como objeto de nossa pesquisa sobre a divindade materna e a maternidade divina, vamos nos ater a esse aspecto: a mãe como fertilizadora e mantenedora. E o segundo aspecto da Deusa, a Mãe, também chamada de Amiga, Amante, Guerreira e Irmã. Ela é considerada a Grande Mãe, a Mãe Natureza, o que significa que é também a Criadora e Doadora da Vida de todas as coisas animadas e inanimadas.
Mares, lagos, fontes e poços sempre foram considerados símbolos femininos na religiosidade arcaica. Eles simbolizavam o útero criador da Deusa. A face mãe da Deusa é seguramente a mais conhecida e a mais visível em muitas culturas antigas.
A Terra nos nutre como uma mãe aos seus filhos e por isso muitas culturas reverenciavam a Terra como a face Mãe da Deusa.
Ela é vista como a representação Divina de nossas mães terrenas e por isso engloba os aspectos de protetora, disciplinadora, a que dá carinho e ensina com sua sabedoria. A face Mãe da Deusa não é diferente. Muitas das figuras encontradas por arqueólogos representavam a Deusa como uma mulher grávida e mostram mulheres com seios fartos e grandes vulvas representando a fartura e a fertilidade.
Apesar de estátuas da Deusa na forma de mulheres grávidas serem proeminentes, elas certamente não são só vistas dessa maneira. Muitas delas trazem crianças no colo, simbolizando o Filho da Deusa, que irá crescer e se tornará seu consorte, companheiro e provedor da tribo.
Como as mães terrenas, a Deusa pode tornar-se fortemente protetora de sua criação e Aquela que provê não só a proteção, mas tudo que é necessário para o desenvolvimento de sua criação.
Ela é simbolizada pelo verão. No verão, as frutas estão maduras, prontas para a colheita. O sol, hoje visto como uma divindade masculina ou o próprio Deus, antes do patriarcado sobrepujar o matriarcado, era um dos símbolos da Deusa. Já que ela é criadora de tudo e está contida em tudo.
Encontramos inúmeras Deusas do Sol, como Brigit, Grian, Sunna. O Sol em seu ápice representa o pináculo do ciclo da fertilidade da Deusa que se torna grávida para, no inverno, dar à luz Ela mesma, bela e plena.
A cor sagrada da face Mãe da Deusa é o vermelho, a cor do sangue que gera e doa a vida. A fase lunar associada a ela é a cheia. Alguns exemplos de Deusa Mãe são: Deméter, Ísis, Gaia, Brigit, Nut, Hera, Dam, Selene e Arianrhod.
Amaury Cândido
Da Editoria Cultura
Fonte: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=246012
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